Thursday, January 18, 2007

Blame Canada

O tema Blame Canada faz parte do filme de animação baseado na série South Park, conhecida pelo seu humor corrosivo e impiedoso. O ponto fulcral que lhe subjaz é paralelo ao que se pode encontrar no documentário Bowling for Columbine, da autoria de Michael Moore, no qual se questiona a importância de tornar os jogos de computador ou a música que se ouve em arguidos principais de um massacre escolar, isto numa sociedade que enfrenta profundas divisões sócio-económicas, vive uma realidade de medo contínuo e recorre à posse e uso de armas como resposta para os seus problemas. Moore conclui que se pretendemos atribuir o grosso da fatia de responsabilidades aos jogos e à música, mais vale incluirmos também o salão de bowling frequentado pelos dois adolescentes que levaram a cabo o tiroteio.

A SIC noticia hoje um caso de agressões entre adolescentes que está a chocar os EUA. Os contornos das agressões podem não ser os mais originais, mas as imagens acabaram difundidas na Internet e esse facto colocou o episódio sob uma nova perspectiva. Tanto quanto parece, está relançado “o debate sobre os efeitos perversos da Internet, sobretudo a facilidade com que se coloca em linha o mais variado tipo de material”, não faltando especialistas que “alertam para o efeito multiplicador que daqui pode resultar”.

Não se pode recusar a pertinência da discussão sobre os abusos que se podem cometer na Internet. O potencial deste meio, de resto, como a maior parte das liberdades, tem como custo associado os eventuais excessos cometidos. A Internet, em si mesma, não é um meio perigoso. Como em tantas outras coisas, tem a fama que o bom e o mau uso lhe impõem. Focar a atenção no putativo excesso de liberdade da Internet acaba a ser uma versão simplista para um problema complexo e uma forma mais ou menos torpe de impedir que se procurem relações causais mais profundas. Como no caso de Blame Canada, trata-se de encontrar um alvo fácil para bode expiatório, fugindo assim ao desconfortável exercício de fazer uma autocrítica severa ao sistema social como um todo e às responsabilidades particulares de cada um. Pensar o lugar que a tolerância perante os actos de violência e perante o sofrimento alheio ocupa no seio das nossas sociedades dá muito mais trabalho e pode produzir respostas, essas sim, que constituem um perigo para as nossas auto-imagens.