Saturday, September 30, 2006

As comparações têm muito que se lhe diga. Robert Fogel não era defensor da escravatura, limitou-se a tentar demonstrar que as condições materiais dos escravos do Sul dos EUA eram melhores que as dos trabalhadores industriais do Norte. Com o artigo da Wikipedia, que João Miranda usa para defender Pedro Arroja, como ponto de referência, pode ainda ler-se o seguinte:

"In fact, Fogel objected to slavery on moral grounds; he thought that on purely economic grounds, slavery was not unprofitable or inefficient as previous historians had argued, such as Ulrich B. Phillips. A survey of economic historians concludes that 48 % "agreed" and another 24 % "agreed with provisos" with Fogel and Engerman's argument that "slave agriculture was efficient compared with free agriculture." In addition, 23 % "agreed" and 35 % "agreed with provisos" with their argument that "the material (rather than psychological) conditions of the lives of slaves compared favorably with those of free industrial workers in the decades before the Civil War.""

Isto é bastante diferente do que Pedro Arroja afirmou na sua entrevista:

"O homem que ganhou o prémio Nobel, este ano, Robert Fogel, provou que se o sistema da escravatura era politicamente inaceitável, em termos económicos, para os negros, era um sistema muito eficaz."

Recorrendo à dicotomia que o próprio João Miranda propôs, resulta que a afirmação do Pedro Arroja é um juízo de valor e não um juízo de facto. Juízo de facto será afirmar que os trabalhadores escravos viviam com melhores condições materiais do que os trabalhadores industriais. Falta dizer, claro, que um juízo de facto carece de confirmação ou infirmação.

Contudo, dizer que um sistema é "muito eficaz" já comporta uma componente valorativa, uma vez que é necessário definir, subjectivamente, a partir de que ponto se aceita a categorização "muito". Se Fogel realizou bem o seu estudo, pode aceitar-se que os escravos, em termos estritamente económicos, viviam melhor que os trabalhadores livres. Mas talvez seja mais difícil concluir que vivessem bem. Muito provavelmente, se quisermos reverter o juízo de valor, este facto indica, antes, um nível de vida perfeitamente miserável para os assalariados. Coisa que, de resto, não é propriamente uma grande novidade.