This is a men's world
Na questão das quotas, que não na da equidade, o João Tunes discorda de mim. Se partilhamos a vontade de ver o fim da discriminação sexual, discordamos nos instrumentos que possam permitir lá chegar. Seria muito bom, já o disse antes, que as quotas não fossem necessárias, que a igualdade surgisse por consenso social e não por imperativo legislativo. Mas não vivemos nesse mundo. A desigualdade e a discriminação existem e, a meu ver, torna-se necessário intervir rapidamente para debelar esse facto.
Um dos caminhos para uma participação mais activa das mulheres na política e nos cargos de liderança passa, como o João muito bem afirma, por uma divisão das tarefas familiares. Quando estas são partilhadas pelo casal, existe um equilíbrio de participação nos mais diversos campos em que cada membro se queira envolver. Da mesma forma, é sabido que existem traços culturais e sociais que alimentam e perpetuam a discriminação sexual, tanto no ambiente familiar como no ambiente profissional. Mas também é verdade que, hoje em dia, existem muito mais mulheres com preparação académica do que, por exemplo, há 30 anos. Contudo, o facto de termos mulheres qualificadas para funções de relevo não tem encontrado igual tradução no acesso efectivo a esses lugares. Se ainda se pode dizer – e pode – que as mulheres são social e culturalmente condicionadas a optar por determinadas áreas de actividade, também se pode afirmar que existem já amplos exemplos que rompem com esses condicionalismos, mas que, mesmo assim, não garantem uma participação em termos de igualdade.
Existe, ainda, um ponto que não consigo deixar de voltar a frisar. Continuo sem perceber por que é que não se há-de arranjar um número suficiente de mulheres interessadas em desempenhar cargos políticos. Tomemos como exemplo a constituição do governo. Dos dezasseis ministérios que compõem o actual executivo, apenas dois são liderados por mulheres. Se eu perguntar se não se arranjam mais seis mulheres com capacidades para o cargo estou a ser demagógico ou estou a colocar uma questão pertinente?
Admito que o que escrevi ontem sobre este assunto possa oferecer uma leitura mais crítica, tal como a que foi feita pelo João Tunes. Para continuar a granjear o crédito que ele tem a amabilidade de me conferir, acrescento algumas explicações. Quando digo que me sinto intrigado com aquela argumentação, não pretendo com isso afirmar que a generalize a todos os que são contra as quotas. Sei que ela existe, sei que já a ouvi tanto da boca de homens como da de mulheres, mas não sei se é um traço dominante ou característico da recusa das quotas (nem pretendo discutir isso). Do mesmo modo, não pretendo generalizar o julgamento de intenções que fiz. Penso que existe (ou que, pelo menos, é possível entrever) uma certa forma de pensar, a qual tentei identificar, embora conceda que a minha escolha de palavras para o fazer não tenha sido a mais adequada e permita uma leitura mais radical do que é, de facto, a minha posição.
Ainda assim, se espero ter retirado o eventual radicalismo que pudesse estar associado à minha argumentação, não pretendo alterar as suas linhas condutoras. Continuo sem perceber por que razão se há-de considerar a introdução de quotas como uma medida protectora, ao invés de a considerar, no essencial, de uma justiça inadiável. Ou que não se prefira este mal menor, por oposição a aguardar uma mudança de mentalidades que tarda em chegar.
|