Tuesday, November 29, 2005

Cavaco Silva, na qualidade de candidato à Presidência da República, lá deixou escapar que está surpreendido com a retirada dos crucifixos das escolas públicas, adiantando que Portugal tem uma tradição de tolerância religiosa. Como a estratégia de Cavaco passa por poupar ao máximo nas palavras, não se sabe se ele estava a referir-se à tolerante luta pela expulsão dos árabes em que se fundou a nacionalidade, à tolerante perseguição dos judeus pela Inquisição, à tolerância característica do colonialismo mercantilista e missionário, ou à tolerância típica do Estado Novo, supremo exemplo de tolerância entre os regimes tolerantes. Aliás, Portugal é tão religiosamente equilibrado e tolerante que tem uma concordata assinada com o Vaticano conferindo privilégios especiais à ICAR que não são reconhecidos a nenhuma outra organização religiosa.
As declarações de Cavaco revelam uma análise muito distorcida da realidade. A terem sido produzidas de boa fé, são um indicador das suas fraquíssimas capacidades para analisar a realidade. A sua visão do que o rodeia é curta. Demasiado curta para quem tem aspirações a ocupar lugares políticos de relevo. Talvez seja um técnico competente. Talvez. Mas foi esta falta de visão que fez dele um mau primeiro-ministro e há-de fazer dele, se for eleito, um mau presidente. Não se trata, nesta questão, de arrogância cultural. Trata-se de mérito e capacidade para estar à altura dos cargos desempenhados. Ou, mais concretamente, da ausência dessas características.