Monday, August 13, 2007

Lies, damned lies and statistics

Caricaturalmente, costuma dizer-se que existem três tipos de mentiras: mentiras, malditas mentiras e estatísticas. A estatística, que tem vindo a ganhar popularidade como ferramenta essencial das ciências sociais, pertence, de facto, ao ramo de conhecimento das matemáticas. Como não existe a tradição de apelidar de mentirosa a disciplina da matemática, deve entender-se que a desconfiança perante a estatística advém sobretudo da má fama das ciências sociais e que estas duas decorrem do desconhecimento geral sobre os fundamentos quer da primeira quer das segundas.

O governo divulgou recentemente os tempos de espera na Saúde. No Zero de Conduta, o Pedro Sales notou não só que existe uma diferença entre falar de tempo médio de espera e tempo mediano de espera, mas também que o cálculo do segundo tem sido claramente favorável ao Ministério da Saúde.

A média é talvez o conceito estatístico mais divulgado. Contudo, a média é um indicador muito sensível a valores aberrantes. Por esse motivo, sempre que se detectem esses casos, é aconselhável trabalhar com a média aparada a 5%, da qual se excluem os valores superiores e inferiores, trabalhando-se exclusivamente os restantes. É importante perceber que a média, tal como a mediana, é uma medida de tendência central, sendo essa a razão pela qual se reduz a distorção introduzida pelos valores extremos no cálculo da média recorrendo à média aparada.

Por seu lado, a mediana é o valor da sucessão que tem tantas observações à sua esquerda como à sua direita. A mediana ignora, de facto, o peso dos valores aberrantes e pode servir como uma medida de tendência central mais rigorosa do que a média.

Mas, se em termos estatísticos isto é verdade, em termos políticos, técnicos e humanos existe uma outra vertente a ser considerada. Não nos podemos esquecer que estamos a falar de tempos de espera no acesso a um cuidado de saúde. Os valores aberrantes, que podem ser tempos de espera muito longos ou muito curtos, são, nesta óptica, muito relevantes. Neste caso, o tempo de espera muito curto deveria ser o objectivo do sistema, pelo que são os tempos de espera muito longos que assumem maior importância, pois correspondem a casos clínicos concretos, a utentes do SNS, pessoas com um nome, uma família e um problema de saúde por resolver.

A estatística não devia ser uma arma de arremesso em guerras políticas, nem um meio de tornar mais opaca a realidade – ao arrepio da sua primordial função que é dá-la a conhecer da forma mais transparente possível. Num mundo ideal, existiria uma ética na divulgação deste tipo de dados, fornecendo a maior informação possível e deixando que a discussão pública decorra a partir de bases firmes. E o governo sempre se poupava às acusações de andar a escolher os indicadores que lhe são mais convenientes.