Monday, January 29, 2007

Saturação

A duas semanas da realização do referendo sobre a despenalização da IVG, confesso-me cansado da troca de acusações, dos juízos de valor e das muitas certezas apresentadas pelas duas campanhas. Imagino que não seja o único a ter atingido este estado de saturação. Parece haver um excesso de propaganda de parte a parte, sendo a blogosfera um bom exemplo disso.

O excesso de propaganda e o tom das campanhas, sejam elas a propósito da despenalização da IVG ou de qualquer eleição para cargos políticos, atinge um nível que se deve considerar preocupante em diferentes aspectos. Nomeadamente, porque facilitam a acção aos estrategas da demagogia e do populismo, apenas beneficiando o arrivismo político, porque abrem o flanco à argumentação dos extremistas, que vêem na democracia e na livre expressão sobretudo desregramento e vícios, e, finalmente, porque tendem a afastar das discussões públicas todos os que não se revêem nestes modelos exacerbados, contribuindo para enfraquecer a participação cívica dos indivíduos.

Há uns anos, Phillipe Breton propôs a recuperação da retórica, destituída da conotação depreciativa que entretanto lhe foi associada. A retórica recuperada com a essência que a viu nascer: uma arte de construir uma argumentação lógica, articulada e inteligível, que sirva para comunicar, para partilhar informações e opiniões e não para manipular consciências ou dissimular intenções.

As democracias precisam de inverter esta tendência em que o simplismo, os preconceitos e os extremismos encontram terreno fértil para crescer. Evidentemente, precisam também de personalidades, da política à sociedade civil, passando pela comunicação social, que saibam reconhecer a importância desta viragem e que estejam realmente interessadas nela.